[ANSOL-geral] Panfleto sobre a proposta-lei 108/IX
J M Cerqueira Esteves
jmce artenumerica.com
Segunda-Feira, 9 de Fevereiro de 2004 - 16:03:36 WET
On Mon, 2004-02-09 at 14:59, Luís Leiria wrote:
> Quero chamar-lhes a atenção para uma coisa:
> A lei 108 não revoga o artigo 81, alínea b)
Provavelmente de pouco valerá não revogar esse artigo 81.
Isto porque ao proteger em absoluto as medidas tecnológicas
eufemisticamente chamadas de "protecção", a lei dá aos detentores de
"conteúdos" carta branca para "fazer lei" por via tecnológica.
Infelizmente não tenho aqui nenhum link directo para discussões
sobre isto, mas lembro-me de o Lawrence Lessig
[ http://www.lessig.org/ ] ter discutido isto de forma bastante clara.
Já é mau simplesmente ter o "fair use" dificultado por vias
tecnológicas; mas, numa situação em que o mercado funcionasse
sem constrangimentos, seria de esperar que pelo menos parte delas
fossem ultrapassadas. Muito pior é a situação em que os produtores e
distribuidores ficam com os seus constrangimentos preferidos
defendidos em absoluto por via legal e tornados portanto,
para todos os efeitos práticos, em... lei.
Creio ser de alguma ingenuidade acreditar-se que o que está
aqui em causa é simplesmente "protecção" de conteúdos contra
"pirataria". É fácil perceber que as novas formas de transferência e
armazenamento de informação criem desafios a alguns modelos de negócio
no âmbito da chamada "propriedade intelectual".
E "protecção" e "pirataria" são termos com bastante valor
propagandístico e que facilmente apelam a pessoas bem intencionadas.
Mas está muito mais em causa do que esses termos possam, mesmo
que legitimamente em vários casos, sugerir.
Na forma actualmente proposta-se, trata-se de facto de redefinir o
ecossistema, redefinir o mercado de forma a sustentar modelos de negócio
artificiais apenas sustentáveis com as tecnologias novas.
Estas são anunciadas como "ameaças", mas de facto está-se a tentar
explorá-las como *oportunidades* para generalizar modelos
como o "pay per view"/"pay per listen"/"pay per read", e isto
chegando até à banal biblioteca municipal. Num mercado
realmente aberto seria difícil sustentar tais modelos de negócio:
para suportar a escassez artificial de que dependem, é necessário
suporte legislativo, frequentemente pedido afinal por quem em discurso
de relações públicas clama por "menos estado".
E a tal "pirataria", a reprodução não só ilegal como não ética e maciça
de materiais de terceiros com fins lucrativos? Continuará, creio, de
boa saúde. Como não acredito que os "detentores de conteúdos" sejam
ingénuos a ponto de esperar o contrário, mais ainda me parece plausível
uma motivação ligada a novas formas de negócio por contraste com real
"protecção".
Quanto às taxas sobre suportes digitais, não me ocorre designação melhor
para elas do que "EXTORSÃO", ESPECIALMENTE num contexto de, *na
prática*, criminalização do "fair use".
Pretende-se alegadamente "compensar os artistas", mas:
- Ao comprar suportes estou a compensar os artistas por cópias
feitas por mim que prejudicariam vendas normais?
Mas essas são legais, posso afinal fazê-las? E se não posso fazê-las
por serem ilegais, estou a pagar taxa por prática criminosa?
E se pago incondicionalmente, é porque sou presumido criminoso?
- Ao comprar suportes por onde NUNCA passar trabalho além do meu,
que legitimidade têm outros artistas e respectivas editoras
para me pedir "compensação"? Tenho de pagar taxa à Sociedade
Portuguesa de Autores para tirar fotografias da família armazenadas
sucessivamente em Compact Flash, discos rígidos, CD-ROMs, discos
magneto-ópticos? Os fotógrafos profissionais podem
pedir à SPA isenções de taxas para comprar Compact Flash?
E a propósito, qual irá ser o papel da SPA? E qual a legitimidade?
Entidade para-estatal?
Estes são apenas alguns dos aspectos tristes que devem ser tornados o
mais públicos possível. Esta lei só não é escândalo nacional
pela crónica desinformação em que vivemos.
Cumprimentos
J Esteves
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