[ANSOL-geral] Panfleto sobre a proposta-lei 108/IX

Luís Leiria Luis.Leiria be.parlamento.pt
Segunda-Feira, 9 de Fevereiro de 2004 - 14:59:22 WET



Olá,
Quero chamar-lhes a atenção para uma coisa:
A lei 108 não revoga o artigo 81, alínea b) do código de direito de autor que dispõe que: 

Art. 81
É ainda consentida a reprodução:
...
b)Para uso exclusivamente privado, desde que não atinja a exploração normal da obra e não cause prejuízo injustificado dos interesses legítimos do autor, não podendo ser utilizada para quaisquer fins de comunicação pública ou comercialização.

Isto é, um artigo semelhante ao chamado "fair-use".

No ponto 1 do artigo 221, diz-se explicitamente que se mantém o b) do 81 (além de outros). O problema é que se eu compro um CD protegido e quero fazer um backup, não tenho forma de fazê-lo a não ser neutralizando a protecção. Só que com isso estarei infringindo a lei. Como o legislador do governo resolve esta contradição?
No artº 221, ponto 2, fala-se de acordos entre os titulares dos direitos e os utilizadores interessados. E no 3, fala-se que o lesado pode solicitar à autoridade competente medidas adequadas...
E no ponto 4 do mesmo artigo, cria-se uma comissão de mediação e arbitragem.
Quer dizer: se eu quero copiar para fins privados um CD protegidos, posso ligar, por exemplo, para o Sérgio Godinho. Se não conseguir posso apelar à comissão de arbitragem. Mas e se for um CD protegido da, digamos... Madonna? Como se vê, é inviável e estúpido.

Outro aspecto é a questão das zonas dos DVDs. Segundo creio, elas não têm suporte legal. No entanto, ao abrigo da nova lei, eu não posso sequer usar o meu leitor de DVD multirregiões.

A questão que ponho é? Acham que devem banidas as medidas tecnológicas eficazes? Ou simplesmente se devem criar todas as limitações cabíveis?

Abraços,

Luis Leiria

-----Mensagem original-----
De: João Miguel Neves [mailto:joao  silvaneves.org] 
Enviada: segunda-feira, 9 de Fevereiro de 2004 14:19
Para: Carlos Patrão
Cc: Lista ANSOL Geral
Assunto: Re: [ANSOL-geral] Panfleto sobre a proposta-lei 108/IX

Em relação ao que levantas:

1) é indispensável para cumprir certos requisitos constitucionais como o
direito à imagem. Se alguém recorrer a esse ponto por "razões de
segurança", aí começo a ficar preocupado.

2) concordo que seja uma limitação artificial, mas não é idiota no seu
objectivo: definir critérios que um juiz possa aplicar. Lembra-te que
toda a legislação de Direito de Autor é artificial (não tem qualquer
base na realidade física).

Quanto ao resto, estamos perfeitamente de acordo. Sugestões de como
contactar partidos políticos e imprensa?

A Seg, 2004-02-09 às 13:50, Carlos Patrão escreveu:
> Viva,
> 
> Também li a proposta de lei 108/IX do governo e tenho a dizer o
> seguinte:
> 
> 1) Decreto-lei nº 63/85 de 14 de Março, artigo 72º (Circunstâncias
> excepcionais), ponto 1
> 
> Os direitos reconhecidos ao autor não tolhem aos poderes constituídos a
> faculdade de permitir, restringir ou proibir, nos termos legais, a
> circulação a representação ou a exposição de qualquer obra quando o
> interesse público o exigir.
> 
> COMENTÁRIO: Isto é censura. Uma situação é o autor ser responsável pelo
> que diz a outra é não o poder dizer em nome do interesse público, lá o
> que este seja.
> 
> 2) Decreto-lei nº 63/85 de 14 de Março, capítulo II, artigo 76º
> (Âmbito), alínea "e)"
> 
> A reprodução parcial, pelos processos enumerados da alínea anterior, nos
> estabelecimentos de ensino, contanto que essa reprodução e respectivo
> número de exemplares se destinem exclusivamente aos fins do ensino
> nesses mesmos estabelecimentos e que, não se tratando de artigos de
> revista, os
> extractos reproduzidos não ultrapassem, no seu conjunto, a décima parte
> da extensão da obra de que provêm, podendo-se em qualquer caso
> reproduzir
> 20 páginas seguidas;
> 
> COMENTÁRIO: Este tipo de limitação é "idiota", penso que o espirito do
> texto deveria ser este: A reprodução parcial é permitida, pelos
> processos enumerados da alínea anterior, nos estabelecimentos de ensino,
> contanto que essa reprodução e respectivo número de exemplares se
> destinem exclusivamente aos fins do ensino nesses mesmos
> estabelecimentos.
> 
> - // -
> 
> Relativamente à harmonização de certos aspectos do direito de autor e
> dos direitos conexos na
> sociedade de informação tenho a dizer o seguinte: 
> 
> 1) Capítulo II, Direitos e excepções, artigo nº 2, direito de reprodução
> 
> Os estados-membros devem prever que o direito exclusivo de autorização
> ou proibição de reproduções, directas ou indirectas, temporárias ou
> permanentes, por quaisquer meios e sob forma, no todo ou em parte, cabe:
> 
>   1.Aos autores, para as suas obras; 
>   2.Aos artistas intérpretes ou executantes, para as fixações das suas
> prestações; 
>   3.Aos produtores de fonogramas, para os seus fonogramas; 
>   4.Aos produtores de primeiras fixações de filmes, para o original e as
> cópias dos seus filmes; 
>   5.Aos organismos de radiodifusão, para as fixações das suas
> radiodifusões, independentemente de estas serem transmitidas por fio ou
> sem fio,
>     incluindo por cabo ou satélite. 
> 
> COMENTÁRIO: Este tipo de lei é o que eu designo como sendo "mais
> papistas que o papa". É de todo louvável que existam excepções a este
> tipo de atitude de "cão de guarda" relativamente aos direitos de
> reprodução, nomeadamente:
> 
> - Fazer cópias de segurança. Quantos de nós já não perdeu software e
> conteúdos por não fazer cópias de segurança ? Vamos ficar proibidos de
> fazer cópias de segurança ? não me parece que seja realista impedir as
> cópias de segurança. 
> 
> - Utilização de cópias por organismos públicos ou associações de
> interesse público que se dediquem à cooperação com países do 3º mundo
> e/ou em vias de desenvolvimento. As transferências de conhecimento para
> países subdesenvolvidos é do mais alto interesse para Portugal, é uma
> área onde o país se deve colocar na vanguarda do que se faz no mundo se
> não queremos ser uma região periférica da Europa.
> 
> Por outro lado o país necessita de obter conhecimentos através da
> cooperação com outros estados membros da CE e como tal não deve
> dificultar essa aquisição de conhecimento.
> 
> 2) Capítulo III, Protecção das medidas de carácter tecnológico e das
> informações para a gestão dos direitos, artigo nº 6, Obrigações em
> relação a medidas de carácter tecnológico, ponto 2.
> 
> Os estados membros, assegurarão protecção jurídica adequada contra o
> fabrico, a importação, a distribuição a venda, o aluguer, a publicidade
> para
> efeitos de venda ou de aluguer, ou a posse para fins comerciais de
> dispositivos, produtos ou componentes ou as, prestações de serviços que: 
> 
>   1.... 
>   2.... 
>   3.... 
> 
> COMENTÁRIO: Este artigo é um forte entrave ao estudo dos mecanismos de
> segurança e à criptografia em geral, o que é que o governo quer ? que o
> país continue a não riscar nada em áreas fundamentais das tecnologias de
> informação ? que não se possam desenvolver protótipos na área da
> criptografia, que não se publique conhecimento sobre esta matéria. Não
> me parece que o nosso país possa dar-se ao luxo de avançar nesta área
> sem obter informação de terceiros.
> 
> Por outro lado não poder estudar uma determinada matéria parece-me que é
> atentatório da liberdade e pões em causa a liberdade de investigar, o
> que é grave.
> 
> 
> CONCLUSÕES:
> 
> - De uma forma geral todo este dispositivo legal protege os direitos (de
> uma forma draconiana) dos detentores do conhecimento. Sendo Portugal um
> pais que importa mais conhecimento que aquele que exporta, penso que a
> lei é pouco patriótica. 
> 
> - Por outro lado a atitude da CE, de não querer abrir mão do
> conhecimento, é prejudicial à sua expansão económica em áreas
> geográficas que lhe são estratégicas: África, América Latina e Médio
> Oriente. E onde sofre uma concorrência crescente por parte dos EUA.
> 
> Gostaria de saber qual é a tua opinião sobre estes comentários, já que é
> possível que o que eu estou a afirmar seja contrariado por outros
> artigos da lei ou mesmo por outras leis.
> 
> Cumps.
> 
> 
> João Miguel Neves wrote:
> > 
> > Para quem quer perceber em pouco mais de uma página o que está em causa
> > com a proposta de lei 108/IX (que implementa a EUCD e outros), veja
> > 
> > http://www.ansol.org/ansolwiki/EucdPropostaLei
> > 
> > Ainda me falta um título ou uma frase chamativa. Amanhã (Domingo) vou
> > tentar transformar num PDF e pôr um um "site" no ar com um url decente.
> > Sugestões?
> > --
> >                                                 João Miguel Neves
> > 
> >   ------------------------------------------------------------------------
> >                        Name: signature.asc
> >    signature.asc       Type: application/pgp-signature
> >                 Description: Esta =?ISO-8859-1?Q?=E9?= uma parte de mensagem assinada digitalmente
> > 
> >   ------------------------------------------------------------------------
> > _______________________________________________
> > Ansol-geral mailing list
> > Ansol-geral  listas.ansol.org
> > http://listas.ansol.org/mailman/listinfo/ansol-geral
-- 
						João Miguel Neves





Mais informações acerca da lista Ansol-geral